O desejo do neurótico obsessivo: um enigma a ser decifrado
- Psicanalise Descolada

- 16 de set.
- 2 min de leitura
O que alguém deseja nesta vida? Mais do que “ser alguém”, talvez o que se queira, no fundo, seja existir. Essa diferença entre ser e existir encontra, na neurose obsessiva, um campo fértil para reflexão. Pois, no coração da experiência obsessiva, está a impossibilidade de realizar plenamente o desejo — e a inevitabilidade de que ele retorne sempre, pulsando sem cessar.

O desejo e a pulsão
Freud nomeou essa força que nunca cessa de se mover de Konstant Kraft: uma potência constante, a própria pulsão em sua essência. O obsessivo não deseja algo específico que possa ser alcançado e encerrado. Seu desejo é enigma, decifrado apenas nos rastros deixados em sonhos, lapsos, sintomas e chistes. O que a pulsão quer? Quer apenas pulsar, repetir-se, insistir.
É nesse ponto que o obsessivo se vê enredado: entre a busca de satisfazer o desejo e a impossibilidade de realizá-lo, entregando-se ao movimento repetitivo que jamais se resolve.
O desejo do Outro
O neurótico obsessivo não se autoriza a desejar por si mesmo. O seu desejo encontra-se colonizado pelo desejo do Outro — pai, mãe, instituições, ou qualquer figura que represente a lei. O obsessivo acredita existir apenas pela aprovação do Outro; sem essa legitimação, não se sente autorizado a pensar, a agir, a ser.
Essa submissão produz uma vida marcada pela hiperatividade do pensamento, pela construção de narrativas rígidas e pela necessidade incessante de responder à demanda alheia. O obsessivo, assim, paga o preço do gozo do Outro, tornando-se prisioneiro daquilo que o tiraniza.
A função do pai e o lugar da lei
No mito familiar e cultural, o pai encarna a lei e a ordem. O obsessivo deseja esse lugar de potência, mas ao mesmo tempo teme e se submete a ele. Deseja ser parte do “clube” que garante a existência simbólica, ainda que isso implique obedecer cegamente às regras do Outro. É nesse aprisionamento que o desejo se mantém em suspenso, sempre endereçado a uma instância externa.
A clínica psicanalítica
A análise oferece ao obsessivo um deslocamento dessa captura. O analista não se coloca como tirano nem como dono da verdade. Ao contrário, sua função é sustentar a escuta para que o inconsciente se produza em palavras.
Lacan nos lembra que a posição do analista não é a de ajudar o sujeito a “ser”, mas sim a abrir espaço para o “des-ser” — uma possibilidade de escapar da tirania do Outro e de suas imposições. O que se ganha, então, não é uma identidade definitiva, mas a liberdade de se relacionar de outra forma com o próprio desejo.
Um fecho necessário
O desejo do neurótico obsessivo é enigma e repetição, é busca e fuga, é submissão ao Outro e tentativa de escapar de sua tirania. A psicanálise não resolve esse enigma — pois ele não se resolve —, mas permite habitá-lo de maneira menos dolorosa.
Nesse processo, o obsessivo pode finalmente soltar as amarras que o prendem à demanda incessante do Outro e descobrir que existir não é obedecer, mas se abrir ao movimento contínuo e criador da pulsão.
Equipe Psicanálise Descolada




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