Tem gente que leva quatro anos de análise para desenterrar o que estava ali, ali mesmo dentro dela, olhando para ela de tão perto que, se fosse cobra, mordia (e na verdade morde o tempo todo). Ou então fala muito, mas demora muitas sessões para deixar cair o véu, o véu daquilo que se está escondendo.
Na análise, você pode até não começar muito bem, mas daqui a pouco você pode estar bailando, pode estar sorrindo, pode estar gostando de estar ali, do e no processo. Você vai saindo de um estado para outro; são modulações possíveis do afeto. Mas é muito mais complicado quando você pega uma pessoa que não pode se expressar, que é massacrada diariamente. Essa pessoa vai minguando. E o psicanalista se sente afetado por isso; não há como não o ser. Há, sim, na dimensão da psicanálise, uma certa tentativa de amparo ao sofrimento, que é sofrimento e que é condição.
É possível curar a angústia e a ansiedade? Eu digo que não. Se a gente acabar com a angústia a gente acaba com a vida. A angústia, vai dizer o Freud, é o afeto por excelência. O afeto sem nome, em estado nascente. Lacan vai dizer que Angústia é afeto que não engana, que não tem disfarce. Você está pelado diante do elemento outro, diante do Verbo, perdeu as estribeiras, perdeu as palavras. E o que a gente faz? Encontra novas palavras.
Ontem você era muito importante pra mim. Hoje eu percebo que não está muito legal. Agora, eu desejo partir. Isso, às vezes, leva vinte anos (entre o ontem, o hoje e o daqui a pouco). Outras formas de ver o mundo, outras formas de experimentar. Nesse sentido é que a gente entende que a psicanálise desfaz crenças, desfaz vícios, sobretudo, vícios afetivos.
É impossível curar a angústia, mas ela se transforma, modula, se metamorfoseia, e se for possível, durante a análise, levar o ser humano por esse caminho de experiência, que é diferente do tormento inútil, aí todo o trabalho do psicanalista fará sentido. E o gozo será mútuo e profícuo.
Carlos Mario Alvarez
Texto esclarecedor e doloroso, saber que nunca viveremos sem angústia, nunca! Ao mesmo tempo é lindo saber que ela, a angústia, tb se transforma e pode ser maia leve, fácil de ser conduzida...
Interessante a fla do Carlos.. quando ela declara que não há vida sem angústia, né ?? Significa que angústia -e, arrisco dizer, ansiedade tbm fazem parte do ser humano com pulsão de vida ou de morte...
Maravilhoso!
Entendi um pouco mais do processo como paciente, depois desse texto!
Lindo texto.
👏🏻👏🏻