Não há como pensar o verso sem o reverso. Passando desde pulsão de vida a pulsão de morte, princípio de prazer e desprazer, inconsciente x consciente, e assim por diante. Estamos sempre no “entre” dois polos. Aqui no “entre” há o tal do sujeito (anotem). Mas vamos pegar "sujeito" e substituir por outro termo: agonística. Agonística implica batalha. Não há como pensar uma pessoa senão no conflito. Saibam que o conflito é condição de existência. E essa agonística implica interesses diferentes que estão se chocando, e fazendo política...
Pensa: marido x mulher, marida x marida; não importa, pensa numa relação. Não tem dois, na tentativa da união, que possa existir sem um terceiro. O terceiro é a chama (ou o chamado) para algo que convoca e equivoca. Já viu conversa de dois: parece conversa de bêbado. Você diz uma coisa e eu escuto aquilo que quero. Eu falo o que penso que quero, você escuta o que pensa que quer. Eu digo A, você entende A ao contrário; eu digo B, você diz bebê; eu digo C, você diz CÊ, não entendeu nada; eu digo D, você diz vai se....; eu digo E, F, H. E assim por diante. Até que se chega no ponto G, e se acredita que se encontrou a volta ao Éden. Mas o ponto G, é apenas um ponto dentro de outro ponto absurdamente amplo de possibilidades.
Trata-se, o tempo todo, de interesses, de embates, e acochambramentos. Se trata, o tempo todo de “formações de compromisso”, de “vamos fazer um acerto de contas. E quem sabe seja bom para mim e para você.” É uma ideia, né?! Porém, não é assim que a banda toca. Em geral, a banda desafina. E é essa história que vocês estão cansados de ver, que começa de um jeito e acaba de outro. Foi bom enquanto durou. Quando dura enquanto é bom, é o melhor dos mundos. Tem a castração, leva e entrega para Iemanjá.
A grande impotência está em se tentar acreditar que dá para ser feliz para sempre. Ou que dá para ficar assim para sempre. Se tem um jardim - e dá para se plantar -, então tem que se dar uma de jardineiro. Precisa ver se a plantinha está gostando do sol, se falta água, se vai podar. Vai conversar com a plantinha. Essas coisas vão permitindo ao jardineiro, pouco a pouco, ir podando as coisas.
As pessoas se afetam. Nada é tão indiferente. Mas uma certa indiferença nos livrará de certos males.
Por Carlos Mario Alvarez
(O) Furto da Rosa
(Érico Braga)
Passado janeiro
Fui ser jardineiro
Plantei uma rosa
Cortei o capim
E quando chovia
Ou o tempo abria
Não tirava os olhos
Do meu jardim
Passava o dia
Cuidando da rosa
Com tanto cuidado
Que ela ficou prosa
E de tão cheirosa
Pulou o cercado
E fugiu com o cravo
Do outro jardim
Foi mesmo assim
Acreditem em mim
E o jardineiro
De lá da sacada
Não sacou nada
Só o vazio
Dentro do cercado
Do seu jardim
E o jardineiro
Triste e calado
De novo sentado
Cortou o capim
E o jardineiro
Sem rosa e cuidado
Sem rosa e coitado
Coitado de mim
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