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Foto do escritorPsicanalise Descolada

EM MEIO AO NÓ DA MADRUGADA

O recalque é o que provoca o pensamento obsessivo. Por quê? Porque o recalque é, para Freud, uma espécie de transformação do desejo. Você não pode lidar com aquela informação, com aquela ideia. Aquilo é criminoso, é malvado, é moralmente questionável... Quem vai voltar é o retorno do recalcado, que não é o que você colocou lá. E ele opera obsessivando a pessoa.

É por isso que, se você fica com menos medo das suas fantasias... Não quer dizer que você vai realizar, mas pelo menos você aceita, entende, enquadra, põe em quadro, desenha, escreve, aí ela perde força. Mas se a gente não trabalha, ela ganha força. Os fantasmas só são fantasmas enquanto a gente não acende a luz e espanta eles. Já repararam, quando vocês estão dormindo e acordam com um pânico enorme? Ouçam o poema ao final. Aprendam que, de madrugada, a gente está mais suscetível, a gente está dormindo, volta àquela posição fetal. Se o sonho é bom, é maravilhoso. Mas se o sonho é ruim, é um horror. A gente tem que se desassombrar. Volto a dizer, a maioria das nossas fantasias, a gente não as vai realizar. Mas também não é para elas lhe afastarem de si, e se afastarem, também. As pessoas são muito envergonhadas, muito culpadas. Aprendam a se liberar dos fantasmas, aprendam a negociar com os fantasmas, porque é isso que vai ajudar a diminuir as tensões dos pensamentos obsessivos. São formas disfarçadas de realização do desejo (isso é bem freudiano). O recalque retorna obsessivamente. A força obsessiva é importante, mas está sendo mal empregada. Vamos encontrar novas formas de usar nossas forças, descobrir novos caminhos, para além do desespero em meio ao nada.


DESESPERO EM MEIO AO NADA

não há agonia que dure mais que um lapso

Lapso: ...é o tempo da vida

Nada dura, nada resiste, somente

a agonia

Quantas noites levantei gelado – gritando para

os meus sentidos: e agora?!!!....

e agora?!!!... o que é que eu faço?!....

O que eu não faço?....

e sem motivo....

As paredes me convinham,

nada lá fora precisava existir

e, entretanto: Agonia!! Agonia!! Hordas

furiosas invadindo minh’alma,

bárbaros inimigos incontidos

comigo.

Desespero em meio a suores de pesadelo!....

...e não era nada

!não era nada!

e no entanto existia fátuo extraordinário

nada – é o espaço desesperado

em que tudo culmina

e calunia

Nada: e mais nada: procura:

e não acha: (debaixo do travesseiro. do Tamarindo?)

Não há nada lá fora: não há nada

ali dentro: e aqui

E a vida é um inigualável centro-fora-tempo

Onde o motivo? Racionalizem-se mil formas de parecença

de causas legítimas, mágoas, agências iníquas,

institucionalizações

malogradas, ache-se a causa, procurem-na, justifiquem-na, algemem-na,

crucifiquem-na, façam extorquir o sentido!?...

nada!

Sozinho é o quarto das causas

Sozinho é o desespero de acordado

em meio a tudo

em meio ao nó

da madrugada

(LIMA, Érico Braga Barbosa. Estilhaços de Babel.

Volume 2. Rio de Janeiro: Antigo Leblon, 2008)


Carlos Mario Alvarez


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